Vivi duas décadas da minha vida debaixo de um regime de ditadura, com o cutelo da guerra colonial sobre a minha cabeça.
Fiquei farto
Naquele tempo, muito cedo a nossa juventude tinha de adquirir consciência social, dispondo-se para a luta contra o facismo, procurando o direito ao voto livre e universal, lutando enfim por tudo o que era básico, há muitos anos, em qualquer país democrático.
Em 1974, com a ajuda dos capitães de abril, o povo português conquistou a tão ansiada liberdade, a democracia, o orgulho de se sentir respeitado e respeitável.
Apareceram os partidos como se desejava, mas progressivamente fomo-nos apercebendo que estes apenas se levam em conta a si mesmos, mandando às malvas quem em si votou.
O Zé povo foi ficando mais chateado, mais alheio, ao ponto de deixar de votar,quando chamado para tal, embora tanto tenha lutado por isso.
As abstenções cada vez são maiores, porque o pessoal já não acredita que o ser voto valha para alguma coisa.
Os senhores eleitos, nomeados, ou pura e simplesmente, colocados estrategicamente em lugares de decisão, perderam definitivamente a vergonha e o respeito por tudo e por todos. Consideram-se acima da lei, perdendo esta a sua universalidade.
É o responsável pela ASAE que fuma num restaurante no próprio dia em que saiu uma lei proibindo isso mesmo; é o primeiro-ministro que fuma num avião, quando tal há muito era proibido; isto para não falar em todas as situações de corrupção e pressões com que somos presenteados diariamente.
Estes figurões estão a pôr em causa o nosso regime democrático, que tanto custou a conquistar à minha geração e às que a precederam.
É altura de dizer basta! Não queremos um regresso à opressão e ao cinzentismo.
A juventude em que confio, tem de se pôr ao alto com esta gente e conseguir os níveis de mobilização e solidariedade, que se registavam há algumas décadas.
Se não se dispuserem a tal, compete-nos a nós, um pouco mais velhos, a defesa dos ideais porque lutámos e fazer este triste País voltar ao rumo do respeito, da solidariedade e da esperança num futuro melhor.
Comigo podem contar. Em nome do futuro dos meus filhos e netos.
Acabou-se a tolerância e os benefícios de dúvida.